quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Então, é natal...


Mãe, o mãe, adoro natal.
Você nunca foi para natal.
Hã?
... Deixa pra lá.

15 minutos depois.

Mãe, o mãe, adoro o natal.
Não, não adora. Você adora os presentes.
Mas nunca tem ninguém presente. A gente sempre passa sozinho.
Hã?
... Deixa pra lá.

15 minutos depois.

Mãe, o mãe...
Não. Não adora! Eu é que adoro quando você cala sua boca!



domingo, 19 de dezembro de 2010

Programa

- Quanto é o programa?
- Sem...
- 100 reais?
- Sem chance, meu bem. Te encherga.
- Claro, um minuto... Onde é que eu pus meus óculos?
- ...
- Sem chance, meu bem. Esqueci meus óculos.


quarta-feira, 12 de maio de 2010


Gestão Empresarial



Abre a porta.

Entra.
Fecha a porta.

Senta-se.

Me olha nos olhos.

Digo: E ai?

Não responde.

Abre a boca, mas não sai som.
Seu lábios estão rachados.

Fecha a boca.
Abre a boca.
Gagueja.
Desvia o olhar e diz: Ah... bom...

Fecha a boca.

Levanto e fico de joelhos na mesa.
Seu rosto está na altura do meu falo.

Digo: Bom é isso.

Soco na cara.


Ele cai pra tras na cadeira.

Estou pesado. Estou gordo.
A mesa de vidro não aguenta.
Cede.


Eu caio em cima dos pedaços. Era vidro temperado.
Ruim pra mim.

Meus braços estão cortados.
Um dos cacos está enterrado no meu pulso.
Enterrado tão fundo que quase transpassa.

Ele me olha assustado. Olhos arregalados.
Os olhos vão cerrando. Não está mais assustado.

Continua me olhando. Olhos semi-serrados.
De ódio.

Ele me odeia.

Todos me odeiam.

E eu amo todos.
Amo incondicionalmente. Amo a vida.


A vida não me ama mais. Nunca amou.
Ela quer me deixar. Ele também.

Ele sai da sala. É ele que tranca a porta.

Mas é a vida que joga a chave fora.




segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010


Diálogo.




O que foi? Não me olha assim não, heim. Você nem sabe o porquê de eu estar chorando. Fica aí, com esse olhar me reprovando. Você não sabe de nada, viu. Ta vendo, você está me fazendo chorar. Eu já tinha quase parado, aí você chegou e aqui estou eu, me dissolvendo em lágrimas. Sabe de uma coisa, eu acho que estou certa. Não devia estar chorando. E sabe por quê? Porque eu acertei. Ele não me merecia mesmo, fiz o certo ao dar uma bota nele... Ele é tão bonitinho... mas é um galinha, e agora está sozinho. Azar dele. Você está me ouvindo? Ele que saiu perdendo, não eu. Para! Não me olha assim, não estou me gabando, estou apenas tendo amor próprio, coisa que já tinha esquecido o que era.”


“Ahhh, tudo será diferente a partir de agora. Não tenho mais a quem dar explicações. A quem justificar atrasos ou conversas com outros caras. Não tenho mais quem me limitar e me censurar. Acabou a ditadura. Não tenho mais... a quem amar. Ta vendo? Tudo tem seu lado triste, e lá vou eu chorar de novo. Não tenho também a quem apertar a mão quando sentir medo – sobre tudo em filmes de terror -, não tenho mais com quem dividir a cama no frio. Não tenho mais com quem contar quando quiser um abraço. Ah sim, tenho meus amigos.”


“Pensando bem, não tenho mais amigos. Renunciei a todos quando decide ficar com ele. Ai, ele era tão lindinho no começo. Só no começo. Meus amigos bem que me avisaram, mas como eles iriam saber? Não dava, dava? Lógico que não. Agora to sozinha. Bom, quem precisa de amigos, não é? Eu não preciso nem de família.”


“Minha família me deixou. Ah, está bem, serei franca. Eu que deixei minha família. Mas não tive escolha. Disseram-me para escolher entre eles ou ele. O que eu iria fazer. É, eu sei, mais eu estava apaixonada, né. Pena que você não saiba o que é estar apaixonada. É tão bom, mas o coração não deixa o cérebro funcionar direito, ai já viu, fazemos algumas besteiras mesmo.”


“Mas acho que você não está muito a fim de ouvir isso, não é? Se pudesse falar, aposto que diria: Não, pare já aí! Vou parar de te atormentar”


“Sabe, às vezes fico pensando que deve ser bom ser igual a você, não se preocupar com nada e passar a noite por aí, de telhado em telhado...”



domingo, 31 de janeiro de 2010

O que Edvard Munch diria se não tivesse fumando seu charuto no jardim?



Ela vai gritar de novo em quinze segundos. No máximo.
Puts, errei por 10.
Caralho, como ela grita, penso.
Tenho vontade de sair na chuva e gritar, as vezes.
Mas ela é demais. DEMAIS.

Que saco, penso no dia seguinte.
Por que? - eu pergunto.
Porque - eu respondo - ela já está gritando de novo.

E no dia seguinte? A mesma coisa - respondo.

Engulo a seco um gole de café. Está gelado, penso.
Que horrível, completo.
...
Até que não é tão ruim, finalizo.

As pessoas julgam demais.
As pessoas reclamam demais.
As pessoas comentam o que lhes é alheio demais.
Ah, as pessoas são demais.

Pelo menos pra mim.
Eu acho.


domingo, 24 de janeiro de 2010


Um Amargo Nicotina.


Pé anti pé.
Pegada por pegada.
Quantos passos aquela Rua já havia recebido?
Isso ela não sabia.
Sete quadras depois, sabe-se lá em quantas bitucas de cigarro já havia pisado.
Riscou um fósforo e acendeu o seu próprio.
'Fósforo legal' - disse um mendigo.
'Tênis legal' - respondeu.
Seria engraçado, caso o mendigo tivesse pernas.

Desejou ter mais compaixão.
Afinal, tinham algo em comum.


sexta-feira, 22 de janeiro de 2010


Na Ponta dos Olhos.



Ela parou e me olhou nos olhos.

Olhou la dentro.

Doeu.

Seus lábio se abriram levemente, como que para dizer alguma coisa.

Novamente se fecharam. O olhar doeu mais ainda.

Ai, chegou na alma, pensei.

Então a voz dela saiu como num sopro, cuspindo aquele ar quente imundo na minha cara:

- Você está sentindo alguma coisa?

- Rá - ri sem graça.

AAiii. Ela me fitou tão fundo que achei melhor responder logo.

- Não. Não sinto nada.

- Você está de troça comigo?

- Rá - e completei a frase antes de ela fizesse doer mais -, não. Mas você está desatualizada.

- O Senhor não vê que está empacando a fila?

- Vejo, pois meu problema não é de visão. Meu problema é que não sinto nada.

- Não sente nada mesmo. Nem vergonha na cara, nem compaixão. Tem mais gente na fila.

- É, eu sei. Quando eu cheguei também tinha gente na fila e eu aguardei.

- O senhor pode se retirar?

- Não. Eu não vou me retirar.

Xi, aquele olhar de novo. Vou fingir um desmaio para não ter que olhar em seus olhos.

Ela mandou o segurança me retirar do hospital.

- Sinto muito senhor. Mas vou ter que te retirar.

- Sim, claro. Mas eu não sinto nada - respondi.